Assinala-se hoje, 5 de Novembro, o Dia Nacional do Cuidador Informal.

Apesar de não ser necessária a identificação de um dia para se discutir esta problemática, a sua marcação no calendário permite-nos vincar e reiterar a ideia de que este grupo existe, de que não pode ser esquecido e de que é crucial encontrar espaço nas agendas política e mediática para se ouvirem as vozes de quem cuida e para se legislar tendo as histórias de vida como bússola na determinação das medidas de apoio que devem ser criadas para proteger todos os cuidadores informais.

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Madalena (nome fictício), é esposa e cuidadora informal do marido, João (nome fictício), diagnosticado com Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA) há cerca de cinco anos. No espaço de seis meses, as perdas provocadas pela doença conduziram o João a uma dependência total e à necessidade de um cuidado permanente. Madalena, até então professora do ensino básico, abandonou a sala de aula para se poder dedicar a uma nova missão: proporcionar o maior bem-estar e a maior qualidade de vida possíveis ao marido. 

Com o diagnóstico de ELA, as suas vidas mudaram radicalmente. Se o João procurava compreender-se em cada perda, readaptando continuamente os seus dias; a Madalena tentava acompanhar a progressão da doença procurando um conhecimento que lhe permitisse dar uma resposta atempada ao marido, confortá-lo, mobilizá-lo, transferi-lo e compreendê-lo na fala residual, hoje praticamente ininteligível.

Quer a Madalena, quer o João, deixaram de lado os seus projetos de vida. Sem aviso prévio, abandonaram as suas profissões, suspenderam as corridas "faça sol ou faça chuva", abdicaram das idas ao cinema, da presença assídua nos festivais de verão ou das viagens-aventura de mochila às costas. A estes, somaram-se as limitações aos programas semanais com os amigos mais próximos - não tanto pela ausência de uma vontade de manter vivos os laços sociais, mas sobretudo pelas dificuldades logísticas e pelos condicionalismos dos espaços, nem sempre acessíveis a pessoas com mobilidade reduzida.

A estes desafios, acrescia um outro que se relacionava com a prestação de cuidados, cada vez mais exigentes e para os quais a Madalena não estava capacitada. Os maiores desafios residiam nos cuidados respiratórios. Aspirar para facilitar a libertação das secreções do João, era um processo difícil para ambos. Procurou informar-se e conhecer melhor esta realidade. Fez duas formações na APELA, mas sentia faltar-lhe mais informação. Ou mais chão.

A informação dava-lhe alguma certeza mas, por si, já não era suficiente. Era necessário um apoio adicional. Uma terceira mão na prestação de cuidados. Falaram-lhe na possibilidade de recrutamento de um Assistente Pessoal, através do Modelo de Apoio à Vida Independente (MAVI). Sim. Talvez isto represente uma ajuda. Os desafios cresciam de dia para dia. E ela não podia continuar assim. A relação com o João estava a transformar-se numa coisa disforme, sem nome, sem rumo, sem nada que os enlaçasse um no outro e que os agarrasse à vida que tinham escolhido viver. Não podia mais. Não assim.

Quedou-se no chão da sala. Madalena era, naquele chão, um grito mudo. A exaustão e a sobrecarga de uma cuidadora, personificadas em algo que a própria não reconhecia como suas. Era o reflexo da imagem de quem cuida ou de quem veste uma condição sem nome, mas que existe. E que não pode ser esquecida, nem abafada pela ideia de que um subsídio financeiro é suficiente para proteger o cuidador informal. Não é. 

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De acordo com um estudo promovido pelo Movimento Cuidar dos Cuidadores Informais, a maioria dos portugueses (97,5%) defende que os cuidadores informais devem receber mais apoio por parte do Estado. E devem. Apesar de a criação do Estatuto representar um passo na proteção e defesa dos direitos dos cuidadores informais, há um conjunto desafios no que diz respeito à sua regulamentação que importa discutir, para que seja possível estender as medidas de apoio a todos os cuidadores, independentemente de integrarem, ou não, os projetos-piloto experimentais em vigor nos 30 municípios escolhidos pelo Governo.

Este é um dos temas que estará em discussão hoje, entre as 9h30 e as 17h00, no Encontro Nacional de Cuidadores Informais, promovido pela Associação Nacional Cuidadores Informais. No âmbito deste evento será destacado o trabalho do Movimento Cuidar dos Cuidadores Informais, uma iniciativa que conta com o apoio da Merck Portugal e da qual a APELA é orgulhosamente parte integrante.