Associe-se a esta iniciativa dos cidadãos. Proteja o Serviço Nacional de Saúde. Proteja o direito à proteção da Saúde.

Leia o texto Por uma Lei de Bases da Saúde feita com as pessoas para as pessoas e, caso concorde, contribua para a mudança assinando a petição disponível aqui.

PROPOSTA DE LEI DE BASES DA SAÚDE

Exposição de Motivos

O Despacho n.º 1222-A/2018, de 31 de janeiro de 2018, criou a Comissão de Revisão da Lei de Bases da Saúde, que teve como mandato apresentar um projeto de articulado de uma nova Lei de Bases da Saúde.

A Comissão, presidida por Maria de Belém Roseira, integrou André Dias Pereira (Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra), Cláudia Monge (Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa e Advogada), Helena Pereira de Melo (Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa), Maria Isabel Nunes Beja Saraiva (Respira - Associação Portuguesa de Pessoas com DPOC e outras Doenças Respiratórias Crónicas), Sofia Crisóstomo (projeto «Mais participação, melhor saúde» e membro de associações de doentes). Foram, ainda, nomeados para prestar conselho à Comissão, quando solicitado, José Reis Novais (Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa) e Luísa Neto (Faculdade de Direito da Universidade do Porto).

A metodologia de trabalho, nos termos do Despacho n.º 1222-A/2018, incluiu a discussão do primeiro projeto legislativo com os parceiros institucionais, os representantes dos agentes do setor e entidades relacionadas, bem como a promoção da discussão pública antes da entrega do projeto final.

De acordo com o Relatório, publicado em Lei de Bases da Saúde: Materiais e razões de um projeto, pelo Centro de Direito Biomédico da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, foram considerados pela Comissão:

A Lei de Bases da Saúde aprovada pela Lei n.º 48/90, de 24 de agosto, alterada pela Lei n.º 27/2002, de 8 de novembro;
Os princípios constitucionais e de Direito Internacional a atender;
A Lei Fundamental e a jurisprudência constitucional;
As convenções internacionais;
Os trabalhos das organizações internacionais com relevância na área da saúde;
A jurisprudência dos tribunais internacionais.

Foi, ainda, considerado:

O anterior projeto de proposta de Lei de Bases da Saúde apresentado pela Comissão presidida por Sérvulo Correia, em maio de 1999;
O projeto de lei de António Arnaut e João Semedo, publicado em 2017 como parte integrante do livro Salvar o SNS Uma Nova Lei de Bases da Saúde para Defender a Democracia;
O documento Agora, A Saúde, Acessível-Gratuita-inclusiva, Princípios e orientações para a revisão da Lei de Bases da Saúde, apresentado por Cipriano Justo e subscrito por 44 personalidades.

Os trabalhos da Comissão tiveram início no dia 14 de fevereiro de 2018, tendo a Comissão reunido 46 vezes até ao dia 11 de outubro de 2018.

A par dos restantes trabalhos e reuniões da Comissão, foram ponderados e atendidos no seu decurso contributos de 39 especialistas das várias áreas do saber: profissionais de saúde, lentes de diferentes áreas da saúde, gestores em saúde, administradores hospitalares, dirigentes, membros de associações de doentes, economistas da saúde, investigadores em saúde, bioeticistas, filósofos, sociólogos, especialistas em sistemas de informação na área da saúde e de tecnologias de saúde. Foi mantido contacto regular com António Arnaut e João Semedo.

Foram recebidos 128 contributos da consulta pública de diversas pessoas e entidades, tendo a Comissão analisado e ponderado esses contributos e revisto o projeto de proposta de lei à sua luz.

Foram auscultados os vários atores da saúde e a sociedade civil em geral, em vários pontos do país, em todos os fóruns e debates para os quais foram convidados os membros da Comissão.

Foi ouvida a comunicação social, aquando da apresentação do primeiro projeto de proposta de revisão da Lei de Bases da Saúde, numa sessão organizada pela Secretaria-Geral do Ministério da Saúde e realizada no dia 19 de junho de 2018, no Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge.

No mesmo dia 19 de junho de 2018, a proposta de lei foi disponibilizada no Portal SNS, para discussão pública durante um período de 30 dias.

A proposta foi enviada pela Comissão para algumas entidades no âmbito da saúde, como as entidades tuteladas pelo Ministério da Saúde e as Ordens Profissionais, para sua análise e pronúncia.

O Governo nunca interferiu na condução dos trabalhos.

A Comissão entregou ao ministro da Saúde Adalberto Campos Fernandes, no dia 3 de setembro de 2018, o seu projeto de proposta de Lei, nunca tendo sido apreciado em Conselho de Ministros.

No dia 13 de dezembro, o Governo, com nova ministra da Saúde, enviou ao Parlamento a Proposta de Lei nº 171/XIII, significativamente diferente, na forma e na substância, do Projeto de Proposta de Lei da Comissão, justificando-se com a resistência “à passagem do tempo e à dinâmica caraterística do setor da saúde”, sendo “intencionalmente concisa” e assumindo-se a pretensão de que “o seu conteúdo programático não restrinja desnecessariamente a função executiva”. E, ainda que declare o não “prejuízo da salvaguarda clara da matriz universal, geral e solidária do direito à proteção da saúde, primordialmente assegurada por serviços financiados por impostos e com gestão pública”, as suas Bases apresentam-se permissivas de várias soluções governativas, incluindo a responsabilidade secundária do Estado e do Serviço Nacional de Saúde (SNS) nas prestações de saúde e na proteção do direito à saúde.

Para além do mais, desconhece-se a metodologia de trabalho desenvolvida para a elaboração da proposta do Governo, as bases técnico-científicas das alterações - sendo apenas apresentadas publicamente motivações ideológico-partidárias -, e os participantes na reflexão e formulação do trabalho final.

Assim, porque os cidadãos não querem uma Lei de Bases de Saúde, na qual não se reconhecem, que:

Afirma o dever, em primeiro lugar, das pessoas de defender e promover a saúde (n.º 3 da Base I e alínea a) do n.º 3 da Base 2 da Proposta de Lei nº 171/XIII);
Não afirma o Estado como garante da proteção da saúde, mas apenas que o Estado efetiva essa responsabilidade - numa medida inexata - através do SNS e outros Serviços e instituições (n.º 5 da Base 1 da Proposta de Lei nº 171/XIII), acompanha a evolução do estado de saúde da população (n.º 1 da Base 8 da Proposta de Lei nº 171/XIII) e identifica áreas específicas de intervenção (n.º 2 da Base 8 da Proposta de Lei nº 171/XIII);
Não define critérios para a prestação de saúde pelo setor privado e social (n.º 6 da Base 1, n.º 1 e n.º 2 da Base 5 e n.º 3 da Base 15 da Proposta de Lei nº 171/XIII), mas apenas a observância do princípio da cooperação, transparência (n.º 2 da Base 15 da Proposta de Lei nº 171/XIII) e respeito pelas normas e princípios aplicáveis ao SNS (n.º 2 da Base 21 da Proposta de Lei nº 171/XIII) e a condição de avaliação de necessidade, sem que fiquem assegurados os critérios dessa avaliação (n.º 1 da Base 21 da Proposta de Lei nº 171/XIII);
Não assegura a promoção do reconhecimento do cuidador informal, mas apenas declara o seu apoio, enquadrado na responsabilidade social e atividade voluntária (n.º 4 da Base 3 da Proposta de Lei nº 171/XIII);
Não garante a proteção pelo Estado das pessoas em contexto de saúde, pois, apesar de desenhar um SNS universal, equitativo e de qualidade, deixa aberta a possibilidade de poder não vir a ser o Estado, através do SNS, o primeiro responsável pela realização do direito à proteção da saúde, por assegurar a promoção da saúde e a prevenção da doença, a prestação de cuidados de saúde e a implementação dos respetivos programas e medidas;
Conforme, não à Constituição da República Portuguesa, à ciência e à vontade dos Portugueses, mas à visão ideológico-partidária do Governo em funções, tal como assumido publicamente pela atual ministra da Saúde.

Apresenta-se, por isso, uma Lei de Bases da Saúde, feita com as pessoas e para as pessoas:

Independente, transparente e participada, suportada num exercício técnico e científico, que congregou os contributos de todos, incluindo as associações de doentes;
Conforme à Constituição da República Portuguesa e não às ideologias político-partidárias e que, nesse âmbito:

É centrada na primazia da dignidade e dos direitos das pessoas em contexto de saúde (Base I, n.º 1 da Base II, n.º 1 da Base III, n.º 2 da Base XXXIV, n.º 2 da Base XL da presente proposta);
Assume a responsabilidade do Estado no cumprimento da tarefa de realização do direito à proteção da saúde e de redução das desigualdades, atuando nas determinantes da saúde em todas as políticas (n.º 1 da Base IV da presente proposta);
Assume a responsabilidade do Estado por assegurar a promoção da saúde e a prevenção da doença, a prestação de cuidados de saúde e a implementação dos respetivos programas e medidas (n.º 2 da Base IV da presente proposta), prevendo o contributo das pessoas para a defesa e a promoção da sua própria saúde (alínea a) da Base VII da presente proposta);
Assume a responsabilidade do Estado pela defesa da saúde pública (n.º 1 da Base XIII da presente proposta);
Estabelece a responsabilidade penal, contraordenacional, civil e disciplinar da inobservância da legislação sobre saúde (Base V da presente proposta);
Assegura o estabelecimento do estatuto dos cuidadores informais (n.º 2 da Base XI da presente proposta), o seu reconhecimento, responsabilização e capacitação (n.º 3 da Base XI da presente proposta) e a definição pelo Estado em conjunto com os ministérios responsáveis pelas áreas do trabalho e da segurança social das medidas de apoio aos cuidados informais e às pessoas cuidadas (n.º 5 da Base XI da presente proposta);
Afirma que a responsabilidade do Estado pela realização do direito à proteção da saúde se efetiva, primeiramente, através do SNS (n.º 3 da Base IV e n.º 1 da Base XXI da presente proposta);
Afirma que realizam prestações públicas de saúde o SNS, outras entidades públicas, os estabelecimentos e instituições dos setores de economia social e privado e os profissionais em regime liberal ou grupos de profissionais que tenham contrato, convenção ou acordo com o Estado (n.º 1 da Base XXIV da presente proposta), sujeito a avaliação da necessidade, designadamente atenta a capacidade instalada, e aos princípios da qualidade e da segurança, da eficácia, da efetividade, da eficiência e da economia (n.º 2 da Base XXIV da presente proposta), devendo estabelecer-se, na celebração e na execução desses contratos, convenções ou acordos, parâmetros de qualidade de atividade assistencial (alínea b) do n.º 3 da Base XXIV da presente proposta);
Afirma que entidades dos setores de economia social e privado e profissionais em regime liberal atuam na prestação de cuidados de saúde, em obediência aos princípios da livre iniciativa (n.º 3 da Base XXXIV da presente proposta), pautando-se a sua articulação com o setor público pelos princípios da eficiência, avaliação e regulação (n.º 5 da Base XXXIV da presente proposta);
Afirma a transversalidade da política de saúde e a sua conciliação com outras políticas setoriais (n.º 1 da Base L da presente proposta);
Determina que o Governo promova legislação que contemple o direito à indemnização pelo dano injusto causado na prestação de cuidados de saúde, promovendo meios expeditos de resolução de litígios em contexto de saúde e o ressarcimento do dano anónimo (alínea a) do n.º 1 da Base LV da presente proposta);
Cria uma comissão para a avaliação independente sobre o cumprimento da Lei de Bases da Saúde (n.º 1 da Base LVI da presente proposta);
É conforme à Constituição da República Portuguesa, garantindo a proteção pelo Estado das pessoas em contexto de saúde e reconhecendo que a organização e as prestações de saúde estão ao serviço das pessoas.

Pelo exposto, e no âmbito da Iniciativa Legislativa de Cidadãos, regulada pela Lei n.º 17/2003, de 4 de junho, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 26/2012, de 24 de julho, Lei Orgânica n.º 1/2016, de 26 de agosto e Lei n.º 52/2017, de 13 de julho (Declaração de Retificação n.º 24/2017, de 5 de setembro), ao abrigo do n.º 1 do Artigo 167.º da Constituição da República Portuguesa, os cidadãos abaixo-assinados apresentam o seguinte Projeto de Lei, em tudo igual ao Projeto de Proposta de Lei apresentado pela Comissão de Revisão da Lei de Bases da Saúde criada pelo Despacho n.º 1222-A/2018, de 31 de janeiro de 2018:

Capítulo I

Disposições gerais

Objeto

A presente lei estabelece as bases da realização do direito à proteção da saúde, garantindo a todos prestações de saúde de qualidade, centradas na proteção da dignidade e dos direitos das pessoas em contexto de saúde, e definindo as bases do Serviço Nacional de Saúde.

Base I

Direito à proteção da saúde

1. O direito à proteção da saúde, como direito humano e direito constitucionalmente protegido e entendido como o direito de todas as pessoas de gozar do melhor estado de saúde física, mental e social possível, pressupõe a criação e o desenvolvimento de condições económicas, sociais, culturais, ambientais e de educação e literacia que garantam níveis de vida e de trabalho suficientes e saudáveis e compreende o acesso às adequadas prestações, designadamente promotoras de saúde, preventivas, terapêuticas, de reabilitação, de cuidados continuados e de cuidados paliativos.

2. A efetivação do direito à proteção da saúde, em todas as suas vertentes e nas suas manifestações individuais e coletivas, constitui o fundamento e a finalidade primeira do Serviço Nacional de Saúde, que deve ser dotado dos meios adequados para o efeito.

3. A proteção do interesse e do bem-estar da pessoa devem prevalecer sobre o interesse único da sociedade ou da ciência, devendo as restrições aos direitos individuais limitar-se ao estritamente necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos.

Base II

Princípios gerais

1. A proteção da saúde ao longo de todo o ciclo de vida, como direito das pessoas e um bem da comunidade, efetiva-se pela responsabilidade conjunta dos indivíduos, da sociedade e do Estado, em liberdade de procura e de prestação, nos termos da Constituição e da lei.

2. O Estado promove e garante o acesso de todos às prestações de saúde, nos limites dos recursos humanos, técnico-científicos e financeiros disponíveis, em obediência aos princípios da autonomia, da vulnerabilidade, da beneficência, da não-maleficência e da justiça.

3. O Estado reconhece a importância social e económica da saúde como promotora do desenvolvimento humano, da inovação e da criação de valor.

4. A promoção e a defesa da saúde enquanto bem público e direito fundamental são efetuadas através da atividade do Estado e asseguradas através do Serviço Nacional de Saúde e de outros entes públicos, devendo as pessoas, as entidades dos setores de economia social e privado e outras organizações da sociedade civil ser associadas àquela atividade.

5. As prestações de saúde são asseguradas, sob regulação e fiscalização do Estado, por serviços e estabelecimentos do Estado, por outras entidades do setor público, do setor de economia social e do setor privado, bem como por profissionais em regime de trabalho independente.

Base III

Política de saúde

1. A política de saúde centra-se na pessoa e na sua dignidade e bem-estar e obedece às diretrizes seguintes:

a) A promoção da saúde e a prevenção da doença, como prioridades no planeamento das atividades do Estado e determinando a definição e a execução de todas as políticas públicas, reconhecendo-se a interligação existente entre o direito à saúde e, nomeadamente, os direitos à alimentação, à integridade pessoal, à privacidade, ao acesso à informação e às liberdades de associação e de circulação, ao trabalho, à segurança social, à habitação, à educação;

b) A igualdade no acesso e na realização das prestações de saúde e a não discriminação das pessoas nomeadamente em razão da sua situação económica, condição social, sexo, género, orientação sexual, ascendência, raça, etnia, cor, língua, idade, constituição genética, deficiência, estado de saúde, território de origem, religião, convicções po­líticas ou ideológicas, instrução e local de residência;

c) A garantia da equidade na distribuição de recursos e na utilização de serviços;

d) A garantia do acesso em tempo adequado às necessárias prestações de saúde;

e) A adoção de medidas especiais relativamente a grupos em situação de maior vulnerabilidade, tais como as mulheres grávidas, puérperas ou lactantes, as crianças, os adolescentes, as pessoas com deficiência, os idosos, as pessoas com doença crónica, em particular com multimorbilidade, as pessoas com comportamentos aditivos, as pessoas com insuficiente situação económica, os reclusos e os trabalhadores cuja atividade o justifique;

f) A conceção, a organização e o funcionamento dos estabelecimentos e serviços de saúde e o desenvolvimento e a gestão dos recursos humanos de acordo com os direitos e com as necessidades em saúde das pessoas e das comunidades, articulando-se entre si e com os serviços associados à realização de outras políticas públicas fundamentais;

g) A gestão dos recursos disponíveis segundo critérios de qualidade, eficácia, efetividade e eficiência de forma a obter deles o maior proveito socialmente útil, alcançar ganhos em saúde e evitar a subutilização, o desperdício e a utilização indevida dos serviços;

h) A promoção do desenvolvimento científico e da gestão do conhecimento para a melhoria da qualidade;

i) A promoção da educação das populações para a saúde com vista a elevar o respetivo nível de literacia para a realização de escolhas livres e esclarecidas e a estimular a adoção de estilos de vida saudáveis e a modificação de comportamentos potencialmente nocivos à saúde;

j) A participação das pessoas na definição, no acompanhamento e na avaliação das políticas de saúde, devendo ser apoiada, em particular, a intervenção das associações representativas das pessoas com doença;

k) A essencialidade da investigação em saúde e para a saúde devendo nela participar os serviços, os profissionais e a comunidade em articulação com os outros setores da sociedade que a ela se dediquem;

l) O reconhecimento da ciência como bem público e do direito de todos beneficiarem do progresso científico, nos termos da lei.

2. A política de saúde tem carácter transversal, dinâmico e evolutivo, adaptando-se ao progresso do conhecimento científico e às condições, às necessidades e aos recursos da realidade nacional, regional e local, visando ganhos em saúde.

Base IV

Responsabilidade do Estado

1. Ao Estado cumpre a tarefa de realização do direito à proteção da saúde e de redução das desigualdades, atuando nas determinantes da saúde em todas as políticas através da criação de condições económicas, sociais, culturais e ambientais que a garantam e otimizando e distribuindo equitativamente pelo território nacional os recursos humanos, materiais e financeiros necessários que devam ser afetados àquela finalidade e fiscalizando a qualidade das prestações de saúde.

2. O Estado é responsável por assegurar a promoção da saúde e a prevenção da doença e a prestação de cuidados de saúde e por implementar os respetivos programas e medidas.

3. A responsabilidade do Estado pela realização do direito à proteção da saúde efetiva-se, primeiramente, através do Serviço Nacional de Saúde.

4. Cabe ao Governo a definição da política de saúde tendo em conta os princípios e as diretrizes fixados na presente lei.

5. Cabe ao membro do Governo responsável pela área da saúde propor a definição da política de saúde, promover e fiscalizar a respetiva execução e coordenar a sua ação com a dos outros ministérios e outras entidades, com respeito pelo disposto na presente lei.

6. Os serviços centrais do ministério que tutela a área da saúde exercem, em relação ao Serviço Nacional de Saúde e às outras entidades que realizam prestações públicas de saúde, funções de regulamentação, orientação, planeamento, avaliação, auditoria e inspeção.

7. O Estado regula e fiscaliza a atividade na área da saúde, sem prejuízo das funções que a lei atribuir às Ordens Profissionais.

8. Compete ao ministério que tutela a área da saúde auditar, inspecionar, fiscalizar e desenvolver a ação disciplinar no setor da saúde, incidindo sobre todos os domínios da atividade e da prestação de cuidados de saúde, sem prejuízo das competências disciplinares atribuídas pela lei às Ordens Profissionais.

9. A lei define a natureza, as atribuições, a organização e o funcionamento da entidade pública à qual o Estado atribui as competências referidas no número anterior, de forma a assegurar com eficiência e prontidão a inspeção das atividades de saúde.

10. O Estado pode constituir uma entidade reguladora da saúde, independente e com funções de autoridade nacional de fiscalização, supervisão e regulação da atividade na área da saúde.

Base V

Natureza da legislação sobre saúde

A legislação sobre saúde é de interesse e ordem públicos, pelo que a sua inobservância implica responsabilidade penal, contraordenacional, civil e disciplinar, conforme o estabelecido na lei.

Capítulo II

Dos direitos e deveres das pessoas em contexto de saúde

Base VI

Direitos das pessoas em contexto de saúde

1. As pessoas em contexto de saúde têm direito:

a) A aceder às prestações de saúde com respeito pelo princípio da igualdade e da não discriminação;

b) A receber as prestações de saúde adequadas à sua situação, com prontidão e no tempo considerado clinicamente aceitável, de forma humanizada, de acordo com a melhor evidência científica disponível e seguindo as boas práticas de qualidade e segurança em saúde;

c) A ver salvaguardada a sua dignidade e respeitada a sua privacidade;

d) A ser informadas de forma adequada, acessível, objetiva, completa e inteligível pelo prestador dos cuidados de saúde, de modo a garantir um esclarecimento efetivo, sobre a sua situação, o objetivo, a natureza, as alternativas possíveis e os benefícios e os riscos das intervenções propostas e a evolução provável do seu estado em função do plano de cuidados a adotar;

e) A escolher outra pessoa que deva receber em seu lugar a informação a que alude a alínea anterior ou recusar receber essa informação, salvo quando possa constituir risco para a saúde pública ou para terceiros;

f) A decidir, livre e esclarecidamente, a todo o momento, receber ou recusar as prestações de saúde que lhes são propostas, salvo nos casos excecionais previstos na lei;

g) A emitir diretivas antecipadas de vontade e a nomear procurador de cuidados de saúde, nos termos definidos pela lei;

h) A ser informadas sobre a investigação relevante para a sua situação de saúde;

i) À reserva da vida privada e à proteção de dados pessoais revelados ou apurados em contexto de saúde, estando os profissionais obrigados ao dever de confidencialidade e sigilo, salvo disposição da lei em contrário;

j) A aceder livremente à informação que lhes respeite, sendo a informação de saúde propriedade da pessoa, sem necessidade de intermediação de um profissional de saúde, salvo quando o solicitar, e sem embargo da adequada proteção do sigilo de terceiros;

k) A ser informadas pelo estabelecimento de saúde sobre o tempo de resposta para a prestação dos cuidados de que necessitam;

l) Ao acompanhamento por familiar, cuidador informal ou outra pessoa por si escolhida, de acordo com a lei e as regras em vigor;

m) A receber, se o desejarem, assistência religiosa e/ou espiritual;

n) A reclamar, fazer queixa ou apresentar sugestões e obter resposta das entidades responsáveis;

o) A receber indemnização pelos danos sofridos, em tempo razoável, nos termos definidos na lei;

p) A participar na defesa dos seus direitos e interesses no âmbito das decisões que sejam suscetíveis de as afetar;

q) A constituir entidades que as representem e defendam os seus direitos e interesses junto dos serviços de saúde, do ministério responsável pela área da saúde e de outras entidades.

2. Ninguém pode ser discriminado no acesso a cuidados de saúde por ter recusado a celebração de contrato de seguro de saúde ou a participação em investigação em saúde ou por ter emitido diretiva antecipada de vontade.

Base VII

Deveres das pessoas em contexto de saúde

As pessoas, em contexto de saúde, devem:

a) Contribuir para a defesa e a promoção da sua própria saúde e para a melhoria da saúde da comunidade;

b) Exercer o direito à proteção da saúde com respeito pelos valores da cidadania responsável e da justiça;

c) Respeitar os direitos das outras pessoas em contexto de saúde e os dos profissionais de saúde;

d) Observar as regras sobre a organização, o funcionamento e a utilização dos serviços e estabelecimentos de saúde a que recorrem;

e) Colaborar com os profissionais de saúde em todos os aspetos relevantes e em função da sua situação concreta;

f) No âmbito do Serviço Nacional de Saúde, respeitar os princípios que o enformam.

Base VIII

Pessoas que carecem de capacidade

Relativamente a menores e a maiores impossibilitados de exercer, plena, pessoal e conscientemente, os seus direitos pessoais, a lei deve prever as condições de exercício dos seus direitos, com observância dos seguintes princípios:

a) Qualquer intervenção sobre uma pessoa que careça de capacidade para prestar o seu consentimento apenas pode ser efetuada em seu benefício direto, salvo previsão legal ou decisão judicial em contrário;

b) A opinião do menor é tomada em consideração como um fator progressivamente determinante, em função da sua idade e do seu grau de maturidade;

c) A pessoa maior sem capacidade para consentir deve, na medida do possível, participar no processo de autorização, sendo tomada em consideração a sua vontade, designadamente a vontade anteriormente expressa, e respeitadas, nos termos da lei, as diretivas antecipadas de vontade.

Base IX

Saúde e deficiência

1. Com vista a assegurar às pessoas com deficiência o gozo do melhor estado de saúde possível sem discriminação nela baseada, o Estado toma as medidas apropriadas para lhes garantir o acesso:

a) A serviços e programas de saúde pública de igual natureza e qualidade aos prestados às demais pessoas, em todas as áreas, incluindo a da saúde sexual e reprodutiva;

b) A cuidados de saúde de que necessitem, em particular devido à sua deficiência, incluindo a deteção e a intervenção atempadas da deficiência, quando apropriadas, e os cuidados destinados a minimizar e a prevenir outras deficiências;

c) A cuidados de saúde que atendam às especificidades decorrentes do género, da idade e da natureza e origem da deficiência e que lhes permitam manter o máximo grau de independência e de inclusão na comunidade em que se inserem.

2. O ministério responsável pela área da saúde promove a formação dos profissionais de saúde no que concerne aos direitos das pessoas com deficiência.

3. Os estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde tomam as medidas de adaptação apropriadas para assegurar que as pessoas com deficiência exercem, em condições de igualdade com as demais, os seus direitos fundamentais em contexto de saúde.

4. O desenho dos produtos, ambientes, programas e serviços em contexto de saúde deve obedecer às regras do desenho universal, salvo quando seja necessário adotar dispositivos específicos de assistência a grupos particulares de pessoas com deficiência, nomeadamente através do recurso à língua gestual ou ao braille.

Base X

Direito de associação e de representação

1. É reconhecido o direito de as pessoas constituírem, nos termos da lei, entidades sob a forma de associação ou outras entidades com personalidade jurídica e sem fins lucrativos que as representem e defendam os seus direitos e interesses junto dos serviços de saúde, do ministério responsável pela área da saúde e de outras entidades.

2. Nos termos do número anterior, podem ser constituídas associações de utilizadores dos serviços de saúde, associações de pessoas com doença, associações de cuidadores informais, associações para a promoção da saúde e prevenção da doença, ligas de amigos de estabelecimentos de saúde ou outras entidades que prossigam os referidos fins.

3. As associações e entidades constituídas nos termos do n.º 1:

a) Devem atuar de forma autónoma, independente e transparente, assegurando a legitimidade e a representatividade da sua atuação;

b) Têm o direito de participar no procedimento legislativo e no procedimento administrativo regulamentar, assim como nos processos de consulta e de audição públicas, nos termos da lei;

c) Têm legitimidade procedimental e legitimidade processual para representar interesses coletivos de acordo com o seu objeto e fins.

4. A Administração Pública deve promover a participação das associações e outras entidades constituídas nos termos do n.º 1 em tudo o que respeite aos direitos e interesses das pessoas no contexto da saúde.

5. A Administração Pública pode apoiar as associações e outras entidades constituídas nos termos do n.º 1 e as suas iniciativas, em particular no domínio da sensibilização, informação, literacia, prevenção, rastreio, segurança, investigação e formação na respetiva área de atuação, fiscalizando a execução dos apoios concedidos.

Base XI

Cuidadores informais

1. É promovido o papel da família, das pessoas próximas e da comunidade na saúde e no bem-estar das pessoas com doença, dependência e/ ou perda de funcionalidade ou em risco de a perder, quando a pessoa manifeste tal vontade.

2. A lei estabelece o estatuto dos cuidadores informais de pessoas em situação de doença crónica, deficiência e/ou dependência, parcial ou total, transitória ou definitiva, ou noutra condição de fragilidade e necessidade de cuidados, os seus direitos e deveres, com vista a assegurar a qualidade dos cuidados informais e o bem-estar das pessoas cuidadas e dos cuidadores informais.

3. A lei deve promover o reconhecimento do importante papel do cuidador informal, a sua responsabilização e capacitação para a prestação, com qualidade e segurança, dos cuidados básicos regulares e não especializados que realizam.

4. A lei deve, ainda, assegurar a articulação entre a pessoa cuidada e os serviços de saúde e a implementação do plano integrado de prestação de cuidados de saúde de que a pessoa carece.

5. O Estado, através do ministério responsável pela área da saúde, em conjunto com os ministérios responsáveis pelas áreas do trabalho e da segurança social, define as medidas de apoio aos cuidadores informais e às pessoas cuidadas, com vista a assegurar a qualidade dos cuidados informais e a melhoria da qualidade de vida da pessoa com dependência e a apoiar os cuidadores informais.

Base XII

Dados pessoais e informação de saúde

1. O tratamento de dados pessoais e, em especial, da informação de saúde relativa a qualquer pessoa, viva ou falecida, obedece a legislação específica de modo a garantir a proteção da sua confidencialidade e integridade, a assegurar o cumprimento rigoroso do dever de sigilo por parte dos profissionais e dos serviços de saúde e a impedir o acesso e uso indevidos.

2. Deve ser assegurada a circulação dos dados de saúde e outros dados pessoais em condições de interoperabilidade, interconexão e rastreabilidade dos sistemas de informação, garantindo a confidencialidade, a portabilidade, a segurança e a proteção dos dados e o respeito pelo princípio da intervenção mínima, de acordo com o regime jurídico aplicável.

Capítulo III

Da saúde pública

Base XIII

Saúde pública

1. A defesa da saúde pública é uma responsabilidade do Estado, devendo este proceder de modo a que todos e cada um reconheçam a saúde como um bem coletivo que devem, em colaboração, promover, preservar e defender.

2. Compete ao Estado acompanhar a evolução do estado de saúde da população, do bem-estar das pessoas e da comunidade, através do desenvolvimento e da implementação de instrumentos de observação em saúde, nomeadamente de monitorização e vigilância epidemiológica, incluindo a laboratorial, com vista, designadamente, à:

a) Deteção precoce de ameaças e de alterações ao estado de saúde da população e, ainda, de tendências de curto, médio e longo prazo;

b) Identificação de áreas prioritárias de intervenção e de outras ações de promoção da saúde e de prevenção da doença;

c) Avaliação criteriosa e rigorosa dos efeitos das medidas adotadas e das medidas a adotar;

d) Coordenação das respostas de emergência, de promoção da saúde e de prevenção da doença ao longo de todo o ciclo de vida.

3. O acompanhamento da evolução do estado de saúde da população deve abranger, designadamente, a mortalidade e suas causas específicas, a morbilidade, as deficiências, as incapacidades e as determinantes desse estado de saúde, nomeadamente, genéticas ou outras biológicas, ambientais, sociológicas, comportamentais e organizacionais, bem como as necessidades em cuidados de saúde.

4. A salvaguarda da saúde pública abrange políticas públicas no domínio das alterações climáticas, do acesso a alimentação adequada e a água própria para consumo de qualidade e de garantia da qualidade do ar, bem como do adequado tratamento e gestão dos resíduos.

5. A prevenção da doença deve permitir um reforço dos fatores protetores da saúde através do apoio ao desenvolvimento de programas de saúde pública, designadamente nas áreas da vacinação, saúde escolar, saúde oral, saúde mental, saúde ambiental, saúde respiratória, saúde sexual, saúde reprodutiva, saúde ocupacional e lesões e traumatismos, bem como na gestão da doença crónica, integrando nas ações os diversos níveis de prevenção.

6. As ações de promoção da saúde e de prevenção da doença devem ser desenvolvidas, de modo integrado e articulado, em rede, atendendo às especificidades locais.

7. As ações de saúde pública devem ser suportadas por sistemas de informação dedicados de apoio e dos adequados estudos, investigação e informação epidemiológica e pela produção sistemática de estatísticas nacionais e comunitárias sobre saúde pública, proteção ambiental, saúde e segurança no trabalho.

8. Deve ser desenvolvido um sistema de vigilância de saúde pública, nos termos da lei, que permita identificar, avaliar, gerir e comunicar, de forma transparente, clara e rigorosa, situações de risco relativamente a doenças transmissíveis e outras ameaças para a saúde pública, bem como ter sistematicamente preparados e atualizados planos de contingência face a situações de emergência ou de calamidade pública e determinar as medidas temporárias necessárias à proteção da saúde pública.

9. É reconhecida a natureza interdisciplinar e intersectorial dos instrumentos de política de saúde pública e promovida a ação concertada dos mesmos pelos diferentes ministérios e serviços, com vista à obtenção de ganhos efetivos em saúde e ao aumento dos potenciais anos de vida saudáveis da população.

10. É promovida a avaliação dos impactos na saúde pública das diferentes políticas, designadamente políticas sociais, de trabalho, ambientais, de obras públicas, de habitação, de urbanismo e de transportes.

11. A avaliação prevista no número anterior e a função de observatório da saúde são realizadas pelo Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge, I.P., sem prejuízo da sua articulação com outros serviços e entidades, designadamente para a obtenção da informação e da colaboração necessárias à concretização dessas atribuições.

Base XIV

Autoridades de saúde

1. As autoridades de saúde situam-se a nível nacional, regional e local, para garantir a intervenção oportuna e adequada do Estado, designadamente em situações de risco para a saúde pública, e estão hierarquicamente dependentes do membro do Governo responsável pela área da saúde, através do diretor-geral competente.

2. O diretor-geral a que se refere o número anterior exerce as funções de autoridade nacional de saúde e constitui o ponto de contacto nos termos dos normativos internacionais aplicáveis.

3. As autoridades de saúde têm por funções a defesa da saúde pública e a avaliação do impacto das decisões de outras entidades nesta matéria.

4. É atribuída às autoridades de saúde a decisão de intervenção do Estado na promoção e proteção da saúde e na prevenção da doença, bem como nas situações de alto risco para a saúde pública e no controlo dos fatores de risco e das situações suscetíveis de causarem ou acentuarem prejuízos para a saúde dos cidadãos e das comunidades.

5. Para defesa da saúde pública, cabe, em especial, às autoridades de saúde:

a) Proceder à vigilância epidemiológica das populações;

b) Proceder à vigilância das condições sanitárias dos serviços, estabelecimentos e locais de utilização pública;

c) Ordenar a suspensão de atividade ou o encerramento dos serviços, estabelecimentos e locais referidos na alínea anterior, quando funcionem em condições de risco para a saúde pública;

d) Desencadear, de acordo com a Constituição e a lei, o internamento ou a prestação compulsiva de cuidados urgentes de saúde a indivíduos que, de outro modo, constituam perigo grave para a saúde pública;

e) Exercer a vigilância sanitária do território nacional e fiscalizar o cumprimento do Regulamento Sanitário Internacional ou de outros normativos internacionais correspondentes;

f) Proceder à requisição de serviços, estabelecimentos e profissionais de saúde em casos de epidemias graves e outras situações semelhantes ou de calamidade pública.

6. Sem prejuízo do disposto na presente lei, os princípios e regras de organização e funcionamento das autoridades de saúde são desenvolvidos em diploma próprio.

7. Compete ao diretor-geral a que se refere o n.º 1, sem prejuízo de outras competências que a lei lhe venha a atribuir:

a) Regulamentar, orientar e coordenar as atividades de promoção da saúde e de prevenção da doença, incluindo a vigilância epidemiológica, ambiental e entomológica e a proteção específica através, nomeadamente, da vacinação e da deteção de doenças genéticas, anomalias congénitas e cancro;

b) Definir as condições técnicas para a adequada prestação de cuidados de saúde, planear, programar e monitorizar a política nacional para a qualidade no sistema de saúde e para a melhoria contínua da qualidade clínica, organizacional e funcional dos serviços de saúde;

c) Coordenar e assegurar a elaboração, a execução, a atualização periódica e a monitorização da execução do Plano Nacional de Saúde, bem como de planos regionais e locais, e dos programas nacionais para áreas específicas da saúde e da doença;

d) Coordenar as relações internacionais do ministério responsável pela área da saúde;

e) Garantir a vigilância epidemiológica a nível nacional, regional e local de doenças transmissíveis e não transmissíveis, incluindo as doenças raras, e assegurar a contribuição da respetiva vigilância no quadro internacional;

f) Gerir, com independência, situações de emergência em saúde pública.

8. As intervenções e as decisões das autoridades de saúde são de natureza técnica, independentes do poder político, suportadas pela evidência científica e apoiadas por sistemas de informação disponíveis em todos os níveis da rede.

9. As funções de autoridade de saúde são independentes das de natureza operativa dos serviços de saúde.

10. Sem prejuízo dos deveres de apoio e de informação de outras entidades, a defesa da saúde pública e as atividades desenvolvidas pelas autoridades de saúde são apoiadas e avaliadas, técnica e cientificamente, pelo Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge, I.P., laboratório de referência do Estado para a saúde e observatório nacional de saúde.

Base XV

Situações de emergência em saúde pública

1. Quando ocorram situações de emergência em saúde pública, em especial situações de epidemia, calamidade ou catástrofe, a autoridade nacional de saúde toma as medidas de exceção indispensáveis, designadamente coordenando a atuação dos serviços centrais do ministério responsável pela área da saúde com as instituições e serviços do Serviço Nacional de Saúde e as autoridades de saúde de nível nacional, regional e local.

2. O membro do Governo responsável pela área da saúde mobiliza a intervenção de outros ministérios e serviços do Estado quando necessário.

3. Pode a autoridade nacional de saúde nas situações referidas no n.º 1 requisitar, pelo tempo absolutamente indispensável, os profissionais e estabelecimentos de saúde em atividade dos setores público, de economia social e privado.

4. Compete à autoridade nacional de saúde articular-se com entidades nacionais e internacionais, no âmbito da preparação para e na resposta a ameaças, deteção precoce, avaliação e comunicação de risco.

5. As funções das autoridades de saúde devem ser apoiadas por um fundo para emergências em saúde pública que possibilite, quando necessário, atuar de forma rápida, integrada e eficiente.

Base XVI

Saúde e genómica

1. O Estado reconhece a importância da genómica no âmbito da saúde pública, devendo o legislador regulá-la no respeito dos seguintes princípios:

a) Dignidade e direitos de todas as pessoas, independentemente das suas características genéticas;

b) Consentimento livre e esclarecido em matéria de testes genómicos preditivos realizados em contexto de saúde e precedidos de indispensável aconselhamento genético;

c) Confidencialidade dos dados genómicos associados a uma pessoa identificável;

d) Não discriminação injusta com base nas características genéticas da pessoa, em particular se associadas a doença ou deficiência;

e) Liberdade de investigação científica na área da genómica, atenta a sua importância para a melhoria da saúde dos indivíduos e da Humanidade no seu conjunto;

f) Ampla divulgação dos conhecimentos disponíveis na área da genómica e promoção do seu intercâmbio a nível nacional e internacional.

2. O Estado incentiva a investigação na área da genómica, em particular em matéria de prevenção e tratamento de doenças e deficiências raras de origem genética, assegurando especial proteção aos indivíduos, famílias e grupos populacionais particularmente vulneráveis por elas afetados.

Base XVII

Saúde mental

1. Todos têm direito a gozar do melhor nível de bem-estar mental, enquanto base do seu desenvolvimento equilibrado durante a vida, importante para as relações interpessoais, vida familiar e integração social, e para plena participação comunitária e económica de cada um.

2. O Estado promove a melhoria da saúde mental das pessoas e da sociedade em geral, designadamente através da promoção do bem-estar mental, da prevenção e da identificação atempada das doenças mentais e dos riscos a elas associados, da proteção dos direitos humanos e da prestação integrada de cuidados de saúde mental às pessoas afetadas por doenças mentais.

3. São combatidos os estereótipos negativos e o estigma associados à doença mental, bem como a discriminação negativa das pessoas que dela sofrem, designadamente através da adoção de programas pelo ministério responsável pela área da saúde ou em articulação com outras entidades.

4. A saúde mental deve, pela sua transversalidade e relação com diferentes setores da sociedade, ser considerada nas políticas com impacto na saúde pública.

5. Os cuidados de saúde mental devem ser centrados nas pessoas, reconhecendo a sua individualidade, necessidades específicas e nível de autonomia, e ser prestados através de uma abordagem interdisciplinar e integrada e prioritariamente a nível da comunidade.

6. A promoção da saúde mental positiva da população, como fator de progresso económico, de coesão social e de desenvolvimento sustentável da sociedade, é assegurada através de programas plurissectoriais que desenvolvam a resiliência e outros recursos pessoais e atuem sobre as determinantes sociais, económicas, culturais e ambientais que os condicionam.

7. As pessoas com doença mental, os seus representantes legais, acompanhantes ou cuidadores devem ser ativamente envolvidos no plano de cuidados a prestar, com respeito pelos direitos das pessoas com doença mental.

8. O Estado apoia investigação interdisciplinar na área da saúde mental que permita produzir evidência sobre o impacto das perturbações mentais, das políticas e dos cuidados de saúde mental, a nível individual e social.

Base XVIII

Saúde ocupacional

1. Todos os trabalhadores têm o direito de beneficiar de medidas que lhes permitam gozar do melhor estado de saúde ocupacional que possam atingir, no âmbito da proteção da sua dignidade no trabalho.

2. O empregador ou, na ausência de relação jurídico-laboral, a pessoa que gere as instalações em que a atividade é desenvolvida, deve assegurar que o trabalho é prestado em condições que respeitem a saúde dos trabalhadores.

3. De modo a proteger eficazmente este direito do trabalhador, os ministérios responsáveis pelas áreas da saúde e do trabalho promovem, em consulta com as organizações representativas dos trabalhadores e dos empregadores, a adoção de medidas que garantam a proteção da saúde no meio laboral, como sejam as que visam assegurar a sensibilização, informação e prevenção em matéria de doenças ocupacionais e os riscos a elas associados.

4. Serão, em especial, adotadas medidas tendentes a melhorar a saúde e a prevenir os riscos psicossociais dos trabalhadores particularmente vulneráveis, como sejam as trabalhadoras grávidas, puérperas e lactantes, os trabalhadores menores em caso de trabalhos que, pela sua natureza ou pelas condições em que são prestados, sejam prejudiciais à sua saúde e ao seu desenvolvimento físico, psíquico e moral e os trabalhadores que têm uma relação de trabalho a termo ou temporário.

5. Para a promoção da melhoria da saúde no trabalho é incentivada a investigação científica na área da saúde ocupacional, em particular a relativa à emergência de novos fatores de risco e de doença, bem como a educação, formação e informação nesse sentido, de modo a sensibilizar-se a sociedade para a importância da prevenção de doenças ocupacionais.

Base XIX

Saúde e envelhecimento

1. Com vista a assegurar o exercício efetivo do direito das pessoas mais velhas à proteção da saúde, permitindo-lhes permanecer durante o maior período de tempo possível membros de pleno direito da sociedade, o Estado compromete-se a tomar quer diretamente, quer em cooperação com os sectores de economia social e privado, medidas apropriadas que visem, designadamente:

a) A difusão das informações relativas aos serviços e equipamentos ao seu dispor em contexto de saúde;

b) O acesso a cuidados de saúde apropriados ao seu estado e que contribuam para que lhes seja possível participar ativamente na vida pública, social e cultural;

c) A disponibilização, em conjugação com os ministérios responsáveis pelas áreas da segurança social, do trabalho, das obras públicas e dos transportes, de bens e serviços apropriados às suas necessidades e estado de saúde de modo a permitir-lhes uma existência condigna e independente no seu ambiente habitual, enquanto o desejarem e for possível;

d) A prevenir que lhes sejam infligidos maus tratos físicos ou psíquicos, incluindo castigos corporais, privações da liberdade e apropriação indevida de rendimentos;

e) O assegurar, às que vivam em instituições, a assistência apropriada no respeito pela sua privacidade e a participação na definição das condições de vida da instituição.

2. Os cuidados de saúde prestados às pessoas mais velhas são globais, integrados e continuados, atendem à sua especial vulnerabilidade, designadamente em situação de multimorbilidade, e são prestados, sempre que possível, por profissionais de saúde com conhecimentos específicos na área.

3. Ninguém pode ser negativamente discriminado ou desrespeitado em contexto de saúde em razão da sua idade avançada.

Para continuar a ler a Proposta de Lei de Bases da Saúde na sua versão integral, consulte o documento em anexo.

Consulte ainda:

  • O Sumário da Proposta, aqui.
  • As disposições gerais da Lei de Bases da Saúde apresentada, aqui.

Documentos Associados