ELA em Stephen Hawking | Entrevista Mamede de Carvalho
"O Cientista Stephen Hawking foi acometido de uma forma de progressão muito lenta da doença, já reportada em outros casos excepcionais na literatura cientifíca. Tal foi facilitado pelo início precoce dos sintomas, pelo cuidados que beneficiou e pela sua enorme motivação pessoal. Factores genéticos desconhecidos, certamente modularam a doença para esta progressão lenta. Os avanços que decorrem na compreensão do genoma da doença darão melhor explicação para este curso tão benigno. No entanto a sua imagem traduz a gravidade da falta de força e da devastadora atrofia muscular, traduzindo a gravidade da doença. Ele viveu muito, mas viveu muito em estado de severa debilidade".
1. Da sua experiência, enquanto neurologista de referência e com larga e comprovada experiência nesta área de atuação, já identificou casos análogos a Hawking, em Portugal, que tenham vivido com ELA por mais de 50 anos?
Não, mas acompanhei dois doentes com tempo de evolução superior a 30 anos.
2. Há alguma explicação cientificamente validada, que nos permita compreender esta sobrevida alargada?
Não. No entanto, a idade precoce de início (maior reserva no número de neurónios); factores genéticos desconhecidos; bons cuidados por parte de cuidadores e a elevada motivação do doente, são factores a considerar.
3. Stephen Hawking teve um papel importante na promoção de um maior conhecimento sobre a doença junto da sociedade civil, do corpo clínico e académico?
Sim. Em particular, junto da população em geral, da sociedade, sobretudo pelo seu mediatismo. Recordo que outros personagens históricos terão morrido devido a esta doença, como o Mao-Tsé-Tung (ou Mao Zedong).
4. Sabemos que a criação de estratégias e apoios capazes de garantir a qualidade de vida da pessoa com ELA é crucial. Para além da fisioterapia, da reabilitação respiratória, da terapia da fala e da psicologia, há mais alguma intervenção que considere prioritária e fundamental para estes doentes?
A motivação do doente e dos cuidadores, assim como a integração eficaz de todos estes parâmetros, em harmonia.
5. Quais as perspetivas futuras em termos de novos medicamentos para a ELA? Conseguimos destacar ensaios ou projetos que apresentem resultados promissores a curto/médio prazo?
Um tratamento mais eficaz irá aparecer, seguramente. Tendo em conta os insucessos com os fármacos neuroprotectores, teremos de explorar novamente os medicamentos que actuam sobre a reinervação e resistência metabólica do músculo.
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Mamede de Carvalho é Neurologista no Centro Hospitalar Lisboa Norte (CHLN-HSM), responsável pela consulta de referência em ELA, investigador, e Presidente do Conselho Científico da APELA.